Cada pessoa tem uma preocupação diferente quando o assunto é cannabis no Brasil. Alguns pensam em como entrar no mercado, já outros em como alavancar seu negócio. Tem aqueles também que necessitam do tratamento para ter mais qualidade de vida ou simplesmente dependem de novas regras para atuarem nessa área. Seja para fins legislativos, medicinais ou comerciais, a cannabis sempre está em pauta.
Pensando nisso, o Sechat entrevistou especialistas no tema para saber sobre suas expectativas e opiniões para o ano de 2022. Confira as entrevistas!
Na área da saúde conversamos com o médico psiquiatra, professor do curso de medicina da UFRR, Pós-graduando em cannabis medicinal e colunista Sechat, Dr. Wilson Lessa Jr., que conta um pouco sobre suas expectativas para o ano 2022.
Sechat – Quais são suas expectativas nessa área para o ano? Com uma possível aprovação do PL399/15, a terapia canabinoide pode evoluir?
Wilson Lessa – Recentemente o Presidente da Câmara afirmou que o PL/399 é prioridade para votação em 2022. Todavia, tenho a impressão que será uma discussão com caráter eleitoreiro e será desgastada como moeda conservadora. Se a discussão sobre vacinação de crianças se tornou pauta conservadora, quanto mais o uso medicinal da Cannabis.
Sechat – O que os médicos devem fazer para se tornarem prescritores?
Wilson Lessa – Os cursos de pós-graduação em Cannabis Medicinal estão avançando cada vez mais. Todavia não basta ensinar sobre o sistema endocanabinoide e as possibilidades terapêuticas com o uso de canabinoides se não houver uma espécie de mentoria de futuros prescritores. Estar convencido não torna ninguém prescritor de imediato.
Sechat – Quais os caminhos você acha que a cannabis irá tomar se o cultivo, produção e comercialização para fins medicinais for aprovado em 2022, o que falta para isso acontecer e qual o papel da big farma nesse contexto?
Wilson Lessa – As discussões legislativas em âmbito municipal e estadual devem crescer exponencialmente no ano de 2022, fruto da sociedade civil organizada. Recentemente o Presidente da Câmara afirmou que o PL/399 é prioridade para votação em 2022. Todavia, tenho a impressão que será uma discussão com caráter eleitoreiro e será desgastada como moeda conservadora. Se a discussão sobre vacinação de crianças se tornou pauta conservadora, quanto mais o uso medicinal da Cannabis. O PL pode até ser aprovado no Congresso, mas terá um provável veto do PR, retorna para o congresso e daí não consegue os 2/3 necessários para derrubar o veto. Já a Big Pharma, tenho a impressão que precisa muito do auxílio do Agronegócio para ampliar os horizontes no Brasil. Resumindo, discussão certíssima na hora política errada, a questão dessa regulação não é somente sobre quem ganhará com isso, é também quem perderá com isso.
Sechat – Em relação a novas descobertas da medicina, tem alguma novidade?
Wilson Lessa – Com um estudo duplo-cego israelense sobre o autismo no início de 2021 e com um outro estudo duplo-cego brasileiro que deverá ser publicado em 2022, além da recente estreia do documentário Weed 6 do Dr. Sanjay Gupta (correspondente médico da CNN), penso que 2022 será o ano da Cannabis e Autismo. As evidências empíricas e esses estudos mais robustos vem com força total.
Sechat – Sabemos que nove produtos à base de cannabis já foram aprovados pela Anvisa só este ano… podemos esperar por mais?
Wilson Lessa – Enquanto não houver aprovação do plantio e produção nacionais não tenho muitas expectativas de muitos produtos. Por encarecer o preço, acredito nesse momento na produção associativa, com profissionalização do processo produtivo, mesmo em caráter de desobediência civil. Quem precisa não espera. A pressa pode ser inimiga da perfeição, mas também pode ser adversária do direito à vida.
Tratando de mercado e negócios, o entrevistado foi o especialista em cannabis, co-fundador e CMO da The Green Hub e colunista Sechat, Marcelo De Vitta Grecco, que ao ser interpelado sobre questões como sua visão do ecossistema mercadológico da cannabis para 2022, o que podemos esperar, quais as novidades e como o mercado vai se posicionar no ano 2022, o especialista é enfático:
Marcelo de Vitta Grecco – Este ano de 2022 é cheio de desafios, mas também repleto de oportunidades. E por que não dizer também de esperança. A despeito da nova variante ômicron ainda nos deixar muito apreensivos, vemos também o poder das vacinas em reduzir drasticamente as chances de evolução ruim da covid-19. Graças a Deus! Temos ainda muito trabalho pela frente no sentido de recuperar todas as perdas que a pandemia nos tem causado. Mas os resultados positivos da vacinação, pelo menos no Brasil, por si só, tendem a melhorar o ambiente para uma futura retomada da economia.
Feita essa introdução, acredito que os desafios para o mercado legal da cannabis no Brasil continuam sendo enormes. Se quisermos chegar próximos de nossos vizinhos, ainda temos de evoluir bastante, a começar pelo estabelecimento do marco regulatório definitivo, que trará mais tranquilidade a quem já investe ou quer investir por aqui.
No entanto, fico feliz e esperançoso, tendo em vista todas as iniciativas nesse campo, com uma boa parte da sociedade entendendo melhor a respeito das diferenças das plantas e, principalmente, dos seus benefícios para o bem-estar e a saúde de muitos brasileiros. As frentes parlamentares em prol da cannabis, que vemos surgir em todas as esferas políticas, são um bom exemplo de que estamos caminhando, na minha opinião, não na velocidade que poderíamos, mas não deixa de ser um avanço. Haja vista, todas as dificuldades que já tivemos de superar ao longo dessa nossa jornada pelo desenvolvimento do ecossistema da cannabis no Brasil.
Eu sempre digo que a face mais visível e mais palatável para a sociedade seja a dos benefícios que a planta proporciona para o tratamento de diversas moléstias crônicas. Entendo também que seja exatamente por aí que, mais e mais, o interesse pelas qualidades da cannabis vão ajudar a romper as resistências que ainda impedem a evolução até mesmo da discussão do tema de forma mais abrangente e sem preconceitos.
Por isso mesmo, os benefícios cientificamente comprovados abrirão as portas para o desenvolvimento de outras áreas, como o cânhamo industrial e as milhares de aplicações dessa planta nos mais variados setores, incluindo até mesmo no campo farmacêutico. Ao longo deste ano, pelo mundo, novas técnicas de aplicações terapêuticas vão surgir para facilitar o uso e garantir soluções completas para variadas necessidades medicinais.
Fora do Brasil, o mercado da cannabis vem conquistando cada vez mais relevância. Uma das tendências é exatamente a de esse mercado passar a ser cada vez mais globalizado. As empresas norte-americanas e canadenses, por exemplo, tendem a disputar esse rico mercado pelo mundo todo. Haverá intensificação do comércio exterior da cannabis, de produtos básicos a opções de uso final cada vez mais sofisticado, principalmente, no setor de alimentos e bebidas. Essas duas áreas também tendem a apresentar muita novidade em 2022.
Com o avanço do mercado e das indústrias, o sentimento de que a cannabis é um bom negócio vai crescer. Com a tendência de que vai garantir resultados para quem estiver inserido nesse universo, certamente o mercado financeiro também olhará com outros olhos todo o nosso potencial. Com isso, os papéis de companhias ligadas à cannabis, negociados em bolsa, tendem a melhorar o desempenho, sempre lembrando que o mercado acionário é de risco, independentemente da natureza do negócio.
E, por último, uma vez que estamos falando em cannabis como negócio em ascensão no mundo, as fusões e aquisições devem aumentar no nosso setor. Isso até já vem sendo observado em países nos quais o mercado legal da cannabis já é uma realidade distante da nossa. Seja para ganhar escala e capilaridade, ou, em algumas situações, para facilitar o acesso a crédito, notícias sobre a compra e a venda de empresas ligadas ao mercado da cannabis passarão a ser cada vez mais corriqueiras no mundo dos negócios.
Por último, mas não menos importante, o convidado para dar sua opinião sobre o meio legislativo e suas previsões para 2022 foi Bruno Pegoraro, presidente do IPSEC (Instituto de Pesquisas Sociais e Econômicas da Cannabis), empresário, co-fundador da primeira frente parlamentar de cannabis medicinal no Brasil e colunista no Sechat, que respondeu nossas questões.
Sechat – O que podemos esperar para 2022 no meio legislativo em relação à cannabis?
Bruno Pegoraro – Na minha opinião, o PL399/15 deve ser votado nesse próximo ano. Porém, dado o atual governo, não acredito que essa lei entre em vigor. Com tudo, tenho a percepção, falando com algumas pessoas de Brasília, que o Canhamo industrial terá mais espaço para avançar em 2022.
Sechat – Quais as chances do PL399/15 ser aprovado no próximo ano?
Bruno Pegoraro – O tema Cannabis Medicinal e Industrial vem despertando o interesse da sociedade civil numa velocidade interessante e mudando o cenário de forma positiva. Isso explica o avanço considerável da procura por entrevistas, audiências públicas e outros eventos relacionados pelos quais temos tido a oportunidade de participar. Entretanto, mesmo com toda notoriedade e informação disponíveis, acredito que o 399, mesmo passando pelo senado e pela câmara, sofrerá o veto do presidente, como já sinalizado anteriormente.
Sechat – Como você enxerga o avanço das resoluções da Anvisa, que vem aprovando alguns medicamentos à base de cannabis para fins medicinais desde o fim deste ano?
Bruno Pegoraro – Com relação ao tratamento da cannabis, devemos ter um aumento de medicamentos registrados e a diminuição dos preços. Porém vejo que a maior dificuldade para busca de tratamento será de quem procurar o SUS, tendo em vista a falta de experiência por parte dos médicos e a falta de uma regulamentação concisa sobre o tema no Brasil.
Sechat – Ao seu ver, porque ainda é tão difícil regulamentar o uso medicinal da cananbis no Brasil?
Bruno Pegoraro – Bem, por mais que existam diversos estudos sobre o uso medicinal da cannabis, ainda existem pessoas que preferem não enxergar as diferenças entre o que fala a lei e o que são opiniões pessoais. Acredito que o cânhamo, por exemplo, tem fortes chances de avançar, mas a cannabis ainda tem um longo caminho pela frente. Sabemos das dificuldades que é diferenciar as duas coisas – Cânhamo de Cannabis – porém, pensando nos meios legais, existem dois caminhos para isso acontecer. Um PDL (Projeto de Decreto Legislativo) que desvincula o Cânhamo da Cannabis ou, a própria Anvisa faz essa desvinculação. O que posso dizer com certeza, é que infelizmente, o legislativo no nosso país é imprevisível, por isso fazer uma previsão agora pode não ser a melhor opção.
Fonte adaptada do site https://sechat.com.br/perspectivas-para-2022-veja-a-opiniao-dos-especialistas-sobre-o-ecossistema-da-cannabis-no-brasil/